Com alguns dos atuais desafios não resolvidos ainda, e outros que ainda virão, estamos realmente preparados para a produção de leite em 2050?
As intervenções visando a redução das emissões de gases, uma grande atenção ao bem-estar animal, a prevenção de doenças, bem como a aplicação de dados e de tecnologia são alguns dos principais desafios a serem resolvidos para garantir uma produção de leite saudável, viável e sustentável em 2050 e depois. Essa foi uma das conclusões do curso de curta duração “Salto para o futuro: Pecuária leiteira em 2050”.
O evento, ocorrido mês passado em Ghent, na Bélgica, antes da reunião regional do Conselho Nacional de Mastite, atraiu 140 profissionais do setor lácteo de todo o mundo. Os organizadores, Royal GD e Beluga Animal Health, convidaram 5 especialistas para falarem sobre os diferentes (mega) desafios da pecuária leiteira de hoje e do futuro.
Redução das emissões de metano
Reduzir a produção de metano pelo rebanho é um importante desafio a ser enfrentado pela indústria de laticínios. Sem isso, o setor estará comprometido nas próximas décadas. Rinse Jan Boersma, da Beluga Animal Health, explicou em sua apresentação que as últimas abordagens em torno do impacto do metano são cada vez mais baseadas na ciência. “Os gases de efeito estufa (GEE) diferem em potencial de aquecimento e persistência”, disse ele. “O metano é um gás de pouca duração, o que significa que ele é decomposto na atmosfera mais rapidamente do que o dióxido de carbono ou o óxido nitroso. Além disso, a maior parte do metano da pecuária leiteira não é procedente de combustíveis fósseis e, portanto, não traz novo carbono para a atmosfera”.
Na apresentação de Boersma, no entanto, foi abordado o conceito de Potencial Aquecimento Global (GWP, sigla em inglês), e seu modelo derivado GWP100 que faz as comparações dos impactos no aquecimento global de diferentes gases. “No entanto, este modelo tem limitações, pois superestima o impacto de GEE de curta duração, como o metano, no aquecimento global. Um novo modelo GWP* corrige os efeitos de GEE de curta duração, especialmente em cenários de emissões estáveis ou redutoras. Este modelo, portanto, fornece uma melhor conexão entre as emissões entéricas de metano e o aquecimento global, ajudando a mudar a narrativa de que a pecuária de leite é um contribuinte líquido para o aquecimento global, para um contribuinte com efeito de “resfriamento líquido”. No entanto, isso só é possível se a indústria de laticínios continuar seus esforços para reduzir as emissões”, explicou Boersma.
Melhoria do bem-estar animal
Marina (Nina) von Keyserlingk da Universidade Britânica de Columbia, Canadá, atualizou a audiência em relação ao bem-estar animal: um importante mega desafio para a pecuária leiteira. Ela explicou: “Para iniciantes, o bem-estar animal é muito diferente de muitas outras disciplinas estudadas pela ciência, porque é uma demanda social e somente existe porque as pessoas fazem questionamentos sobre a forma de produção de seu alimento. O bem-estar animal se tornará cada vez mais importante à medida que nos aproximamos de 2050, e seremos confrontados com desafios complexos que poderão requerer mudanças transformacionais. Mais de 30 anos de pesquisa não foram suficientes para reduzir as altas taxas de claudicação, por exemplo. Então temos que nos questionar: estamos usando as práticas corretas ou precisamos nos transformar de forma a conseguir avanços significativos para reduzir esta condição?
Uso de tecnologias
Um outro mega desafio são as oportunidades geradas em torno de dados e do uso de tecnologia. Ainda que estejam disponíveis, uma grande quantidade de dados sobre vacas leiteiras hoje, resta saber como explorar melhor o fluxo de informações no futuro. Ilka Klaas da sueca DeLaval declarou que podemos e devemos melhorar muito a saúde e o bem-estar das vacas graças à utilização de tecnologias de sensores e digitalização.
“A perspectiva para 2050 é de que a tecnologia, a sustentabilidade e o bem-estar animal sejam integrados para a produção de leite e derivados de alta qualidade. Penso também que a inteligência artificial para a tomada de decisão, gerenciamento, operacionalização e manejo será o novo ‘normal’ em rebanhos leiteiros sustentáveis. Isso irá além dos sistemas de alerta, à medida que avançamos para mais modelos de análise e previsão fáceis de usar e centrados no produtor”.
Klass destacou o trabalho da DeLaval visando a integração de dados para ajudar os agricultores a encontrar rapidamente as vacas que correm o risco de adoecer e identificar imediatamente a mamite e a cetose. De acordo com Klaas, mais abordagens serão necessárias para a produção de leite em 2050 e posteriormente. “Mas, para desbloquear o potencial total da pecuária de precisão, serão necessárias inovações consistentes, pesquisas e desenvolvimento, parcerias, diretrizes e definições acordadas em escala internacional. Até o momento, esse potencial está pouco desenvolvido e pouco estudado”.
Estamos prontos para 2050?
“Vivemos em um mundo leiteiro complexo onde não cabe solução única e simples. Quando começamos a trabalhar em uma determinada área, como por exemplo, melhoria da produção de leite por vaca, isso pode resultar em efeitos sobre outras coisas, como o trabalho, a saúde animal, eficiência do nitrogênio e o uso de antibióticos. E embora seja um mundo complexo, é um mundo com ambição”, disse Ynte H. Schukken, CEO da Royal GD, em sua palestra.
“Outros palestrantes enfatizaram que temos uma caixa de ferramentas cada vez maior – como tecnologia e inteligência artificial, e alternativas aos antibióticos – que podem nos ajudar a desvendar a complexidade e reduzir a pressão sobre o trabalho, e melhorar a saúde e o bem-estar animal”.
Ele mencionou que o uso de diferentes tecnologias e conhecimentos será fundamental, pois prevemos que estaremos lidando com rebanhos cada vez maiores no futuro: “O gerenciamento de grandes rebanhos requer mudanças em nossas atuais abordagens sobre o manejo da produção. A complexa tomada de decisão que vem com isso pode ser resolvida através de inovações contínuas e orientação de cientistas e tomadores de decisão. Portanto, quando chegarmos a 2050, creio que a produção de leite terá um futuro brilhante à frente”, concluiu Schukken.
Fonte: Dairy Global (tradução livre)